“Fede. Em algumas pessoas, dá um bode, um mal-estar enorme. Mas álcool também não cai bem em muita gente. O Jornal de Medicina da Nova Inglaterra publicou um editorial, semana passada, aprovando o uso de maconha para doentes com dor. Na Califórnia, maconha para paciente foi aprovada num plebiscito. Mas a resistência é grande. Em parte é de pessoas que consideram drogas maléficas e diabólicas, uma possessão do demônio em forma química. Na maior parte são as burocracias, imensas, de justiça e polícia, que recebem suas verbas enormes para combater o uso de drogas. Não combatem bem, para dizer o mínimo. Em qualquer esquina de cidade grande nos EUA, há um traficante provando a versatilidade da livre empresa.
Maconha fede. Só dá um torpor, leva-nos à introspecção. Não é uma droga sociável, como cocaína, em que o tomador trinca os dentes e fala pelos cotovelos. O duque de Windsor, ex-rei da Inglaterra, que abdicou do trono para se casar com uma comum, Wallis Simpson, no fim da vida estava com uma bronquite dos diabos. Foi ao médico, que lhe disse que parasse de fumar. O duque reclamou da perda do vício delicioso. O médico recomendou maconha. O duque disse que não podia a essa altura da vida virar maconheiro. Ibrahim Sued, de quem li essa história, aprovou o comportamento do duque.
Droga devia ser legalizada. Com os devidos controles para crianças, que, de resto, existem para álcool e cigarros. Não há vício de drogas. Há viciados. Conheço gente que não pode tomar droga porque não pára mais. Mas há muito mais pessoas que tomaram drogas de toda espécie, pararam, ou continuam vez por outra, e nada acontece com sua capacidade de funcionar. Maconha é das mais inofensivas”.
*Paulo Francis, na última coluna "Diário da Corte", escrita em 09 de Fevereiro de 1997 no Jornal O Estado de São Paulo, na véspera de sua morte.